sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Revelados mais segredos do Alzheimer


  • Proteína ligada ao funcionamento da visão na juventude é relacionada à doença na velhice

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Memória apagada: proteína funciona como um ‘freio’ nas conexões entre os nerônios
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Memória apagada: proteína funciona como um ‘freio’ nas conexões entre os nerônios Latinstock
RIO - Uma proteína responsável por ativar as regiões do cérebro que irão processar as informações fornecidas pelos olhos durante a infãncia e a adolescência é o novo alvo dos cientistas na luta contra o mal de Alzheimer, doença neurodegenerativa que afeta milhões de pessoas no mundo. Em experimentos com camundongos e tecidos humanos, pesquisadores das universidades de Stanford e Harvard, nos EUA, relacionaram a ação da proteína ao aparecimento de placas de uma substância conhecida como beta-amiloide no cérebro, cujo acúmulo é característico da doença na velhice. A descoberta abre caminho para a criação de remédios ou tratamentos que inibam a atuação da proteína ou interrompam sua produção, desta forma atrasando ou mesmo impedindo o surgimento do Alzheimer e seus sintomas.
Segundo os cientistas, a proteína, chamada PirB nos animais e LilrB2 em seu equivalente humano, fica na superfície das células cerebrais mediando a competição entre os olhos para se conectarem com uma região limitada do órgão durante o crescimento. Esta disputa, chamada plasticidade da dominância ocular, ocorre apenas no início da vida e responde à experiência. Assim, se um dos olhos tem algum tipo de problema, como a catarata congênita, ele permanentemente perde terreno para o processamento de suas informações pelo cérebro para o outro olho.
Sem a proteína e sintomas da doença
Responsáveis por identificar a proteína e seu papel no cérebro, Carla Shatz, professora de neurobiologia da Universidade de Stanford, e sua equipe notaram que camundongos sem o gene para produção da PirB mantiveram a flexibilidade na designação das conexões oculares mesmo na idade adulta. Eles decidiram então investigar se a proteína também atuava como um “freio” na plasticidade de outras funções cerebrais, como a relacionada aos sintomas de Alzheimer, causados pelo progressivo enfraquecimento das conexões entre os neurônios, chamadas sinapses.
Para tanto, Shatz e seus colegas primeiro apagaram o gene que ordena a produção da PirB em camundongos geneticamente modificados para desenvolverem Alzheimer. Depois de nove meses de vida, estes animais normalmente apresentam os sintomas da doença, mas sem a proteína isso não aconteceu. Diante disso, eles resolveram investigar o motivo, especialmente se existia alguma relação entre a PirB e o acúmulo de placas de beta-amiloide no cérebro.
— Sempre achei estranho o fato destes camundongos, na verdade, de todos os modelos de Alzheimer em camundongos que nós e outros grupos estudamos, não terem problemas de memória antes de envelhecerem, apesar de seus cérebros apresentarem altos níveis de beta-amiloide desde a juventude — comentou Shatz, coautora de artigo sobre a pesquisa publicado na edição desta semana da revista “Science”. — Mas os camundongos sem a PirB ficaram protegidos das consequências de suas mutações que provocam a produção de beta-amiloide, restando-nos assim a pergunta do por que disso ter acontecido.
Uma união perigosa
E a explicação veio das mãos de Taeho Kim, pesquisador do laboratório de Shatz em Stanford e principal autor do artigo na “Science”. Ele imaginou que a PirB e a beta-amiloide estavam se unindo de alguma forma, fazendo com que a proteína pisasse tão fortemente no “freio” das sinapses que elas desapareciam completamente, levando consigo a memória. Experimentos com os camundongos acabaram por mostrar que de fato a proteína e a beta-amiloide criam uniões fortes, dando início a uma reação em cadeia que prejudica o funcionamento dos neurônios.
Além disso, as experiências revelaram que esta união tem início logo cedo na vida, quando a beta-amiloide ainda trafega livremente pelo cérebro e não se acumulou em placas. Por fim, Kim também demonstrou que esta união também acontece entre a a beta-amiloide e a LilrB2, a equivalente humana da proteína nos camundongos.
— Nossa descoberta sugere que o mal de Alzheimer começa a se manifestar muito antes da formação das placas ficar evidente — disse Shatz. — Estamos apenas começando a investigar o que todas essas proteínas fazem no cérebro e, embora sejam necessárias mais pesquisas, elas podem ser um novo alvo para remédios contra o Alzheimer. Espero que este achado seja animador o bastante para que alguém em empresas farmacêuticas ou de biotecnologia leve a ideia adiante.

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domingo, 22 de setembro de 2013

Cientistas descobrem associação entre Alzheimer e diabete


04 de maio de 2009 • 11h33 • atualizado às 11h35



Nos últimos cinco anos, os cientistas e médicos já vinham associando doença de Alzheimer ao diabete do tipo 2. Evidências epidemiológicas já indicavam que, do ponto de vista clínico, pacientes com Alzheimer têm maior tendência a apresentar diabete tipo 2 e que o oposto também acontece.
As razões que poderiam explicar esta associação, no entanto, não eram claras. As primeiras pistas só surgiram a partir dos estudos da bióloga e neurocientista Fernanda De Felice, que, durante estágio na Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, descobriu que os receptores do hormônio insulina nos neurônios são perdidos em pacientes de Alzheimer.
O passo seguinte, reunindo cientistas brasileiros e americanos, foi a proposta de tratar neurônios afetados pelo Alzheimer com uma combinação de insulina e rosiglitazona, substância habitualmente empregada para tratar pacientes de diabete tipo 2.
Testes de laboratório, conduzidos por De Felice, que é Jovem Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ, e pelo bioquímico Sérgio Teixeira Ferreira, ambos do Instituto de Bioquímica Médica, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, mostraram que a experiência, feita com células cerebrais em cultura, efetivamente evita a progressão dos efeitos degenerativos da doença.
"Antigamente, acreditava-se que o cérebro não precisava de insulina para seu funcionamento. A descoberta de Fernanda confirma exatamente o contrário. Além de contribuir para o processo de obtenção de energia para que o cérebro funcione, a insulina também desempenha um papel importante na formação da memória" explica Sérgio Ferreira, Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ, e um dos coordenadores da pesquisa 'Oligômeros protéicos solúveis como neurotoxinas e novos alvos terapêuticos nas doenças amiloidogênicas humanas'.
Ele prossegue, explicando que, como estudos anteriores já haviam demonstrado, em portadores de Alzheimer, os neurônios se mostram mais resistentes à insulina e à sua ação benéfica. Tudo isso leva os pesquisadores a considerarem a doença de Alzheimer como um novo tipo de diabete, que afetaria apenas o cérebro - a chamada diabete tipo 3.
Nos doentes acometidos pelo Alzheimer, certas substâncias tóxicas, os chamados oligômeros, se ligam aos neurônios, atuando sobre eles como radicais livres e levando à perda de suas funções normais. Recentemente publicado na revista PNAS, o estudo de Ferreira e De Felice contou ainda com a participação dos estudantes Marcelo N. Vieira e Theresa R. Bomfim, ambos Bolsistas Nota 10, da FAPERJ, e Helena Decker. Os resultados do trabalho mostram que o dano induzido pelos pesquisadores em células sadias - e que ocorre poucas horas depois que os neurônios são expostos à ação dos oligômeros - pode ser evitado quando se aplica à cultura a combinação de insulina e rosiglitazona.
"Com isso aumentamos a sensibilidade das células à insulina, e, por sua vez, as duas substâncias evitam que os oligômeros se liguem aos neurônios em cultura, impedindo que percam suas funções. Assim tratados, os neurônios mantiveram as sinapses preservadas e permaneceram ativos" diz Ferreira. A partir desses resultados e do desenvolvimento das próximas etapas da pesquisa, cria-se a possibilidade de que, pela primeira vez, se possa contar com um medicamento que efetivamente reverta os efeitos iniciais da doença.
Antes, porém, que os doentes de Alzheimer corram a se medicar com insulina, Ferreira adverte que, embora os resultados em cultura tenham sido bastante animadores, ainda é cedo para se falar num tratamento direto. Depois dos experimentos em laboratório, será preciso passar para os testes com animais, para mais tarde avaliar a combinação terapêutica em humanos.
"Também é preciso levar em conta que a diabete é uma doença sistêmica, ou seja, age sobre todo o organismo humano. O que queremos é fazer com que a insulina e a rosiglitazona atuem apenas sobre o cérebro" explica. Para tanto, pesquisadores de outros países já estudam formas de aplicação nasal das substâncias.
"A aplicação de insulina da forma usual nos traz dois problemas: pode-se levar os pacientes a um desequilíbrio na glicemia. Sabemos também que, com o uso continuado, diabéticos do tipo 2 acabam ficando com a barreira hematoencefálica - que protege o cérebro e, em geral, é razoavelmente permeável à insulina - cada vez mais resistente a esse hormônio" explica.
Essa resistência agravaria a situação dos neurônios, afetados pela ação dos oligômeros. A equipe também está testando outras substâncias de ação semelhante.
Segundo estimativas recentes, há cerca de um milhão e duzentos mil brasileiros com Alzheimer. A vida média dessas pessoas em geral gira em torno de oito a dez anos depois do diagnóstico.
Atualmente, esses pacientes contam com apenas dois tipos de medicamentos: os inibidores de acetilcolinerastase e a memantina para tratamento. Mas nenhum dos dois realmente funciona. Com a nossa pesquisa, abre-se uma grande porta para o desenvolvimento de novos medicamentos, com possibilidade de alterar o curso da doença. As perspectivas são bastante promissoras.


Jornal do Brasil