sexta-feira, 7 de outubro de 2011



Dr. José Felippe Junior fala sobre Doença

de Alzheimer  
                             
Mal de Alzheimer, um distúrbio silencioso que afeta 10% das pessoas com mais de 65 anos. Buscamos saber mais sobre a doença consultando uma autoridade médica, o professor José de Felippe Júnior que  nos disse que as causas da doença ainda são pouco conhecidas. Sabe-se que os fatores de risco são: histórico familiar de demência, alterações de cromossomos, estresse oxidativo e exposição ao alumínio quando o silício estiver baixo. A doença também é mais comum entre as mulheres e que casos de somente motivo genético são muito raros.


Repórter: Poderia comentar amiúde sobre essa doença? 

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Dr José de Felippe Júnior:  A Doença de Alzheimer está se tornando mais freqüente à medida que aumenta a sobrevida média da população afetando de 5 a 15% das pessoas com idade superior a 65 anos (Katzman - 1986). Com o aumento da idade ocorre um declínio progressivo da função de vários orgãos sendo o mais sensível os neurônios do cérebro.

Repórter: Trata-se de doença hereditária?

Dr. José de Felippe Júnior: Uma pequena proporção de pacientes possuem uma forma geneticamente transmitida por herança autossômica dominante, porém a maioria apresenta a doença de uma forma esporádica e sem relação com a transmissão genética.

Repórter: Quais são os sintomas que a doença apresenta?

Dr. José de Felippe Júnior:   O principal sintoma é a perda progressiva da memória. As alterações patológicas encontradas na doença   envolvem o hipocampus e o neocortex, especialmente dos lobos temporais onde se encontram as lesões características da doença, isto é, as placas neuríticas beta-amiloides e o emaranhado neurofibrilar.

Repórter: Como está o avanço da medicina em relação a Doença de Alzheimer?

Dr. José de Felippe Júnior:  Muito se tem feito em pesquisas e tratamentos, porém até o presente momento não se encontrou a terapêutica definitiva. Entretanto, os autores têm descrito na literatura médica  de bom nível importantes elementos da fisiopatologia desta doença que nos permitem pensar que estamos muito perto de alcançarmos uma estratégia terapêutica eficaz. Para manterem as suas funções as células do nosso organismo devem produzir energia: ATP (trifosfato de adenosina). Sem energia a célula não consegue sintetizar hormônios, enzimas e neurotransmissores como a acetilcolina de capital importância na memória, na concentração e em muitas outras funções cerebrais.

Repórter: Como compensar essa perde de energia?

Dr. José de Felippe Júnior: As duas vias principais de geração de ATP são a glicólise anaeróbia (citoplasma) e a fosforilação oxidativa (mitocondria), sendo esta última 17 vezes mais eficaz na geração de energia. As mitocondrias são as organelas que produzem a maior parte dos ATP necessários para a função normal do neurônio e para a sua sobrevivência. Recentemente vários autores constataram importantes alterações da fosforilação oxidativa em pacientes portadores de doença de Alzheimer. Parker demonstrou deficiência do complexo IV da cadeia respiratória mitocondrial ; Zubenko demonstrou deficiência dos complexos II e III e Sorbi verificou diminuição da enzima piruvato-dehidrogenase no cérebro de pacientes com Alzheimer. O significado destas alterações mitocondriais devem ser interpretadas com cautela porque não sabemos ao certo se elas são a causa ou o efeito da doença. Entretanto, na fase inicial da doença o que predomina no cérebro destes pacientes é uma importante alteração do metabolismo energético ( Duara - 1993). De fato, à medida que a doença progride Mielke observou em estudos seqüenciais com tomografia por emissão de positrons, uma diminuição sistemática da utilização de oxigênio e glicose e Friedland observou um precoce defeito do metabolismo da glicose em regiões dos lobos temporal e parietal que são justamente os locais onde se encontram as placas neuríticas. Muitos pesquisadores encontraram evidências diretas de defeitos da cadeia respiratória mitocondrial na doença de Alzheimer. Preparados mitocondriais de cérebros doentes demonstraram uma redução de 40% na atividade do Complexo I e 53% de redução da atividade do Complexo IV o chamado complexo citocromo oxidase ( Parker-1990 e Parker - 1995 ). Estas reduções de atividade dos componentes da cadeia respiratória mitocondrial são predominantes justamente nas regiões temporais e parietais ( Kish - 1992 , Mutisya - 1994 e Chagnon - 1995 ). Estudos histoquímicos confirmaram o defeito da atividade do complexo IV ( Simonian - 1993). Existem evidências epidemiológicas que sugerem maior incidência de Alzheimer nas mães do que nos pais dos pacientes com Alzheimer , sugerindo o papel da herança materna de mitocondrias com mutação de DNA. ( Edland - 1996).

Repórter: Puxa vida, é complicado a bessa.

Dr. José de Felippe Júnior: E tem mais, a fosfoetanolamina (PEA) e a etanolamina (EA) estão presentes no cérebro normal em grandes quantidades (Perry-1971). Essas aminas estão envolvidas no metabolismo dos fosfolípides e são precursoras da fosfatidiletanolamina e da fosfatidilcolina,  dois dos quatro fosfolípides que compõe a membrana celular (Pocellati -1971 e Corazzi - 1986). Foi demonstrado por vários pesquisadores que a PEA e a EA são liberadas por despolarização em algumas circunstâncias, embora não se saiba qual é o verdadeiro significado fisiológico desta constatação (Wolfsensberger - 1982, Maire - 1984, Corazzi-1986 e Pershak - 1986 ).

Repórter: Como se chegou a essa conclusão?

Dr. José de Felippe Júnior:  Em 10 pacientes com idade média de 76,6 anos com doença de Alzheimer confirmadas neuropatologicamente, foram dosados a fosfoetanolamina e a etanolamina nas regiões de predileção da doença, utilizando-se a cromatografia de alta performance com detecção eletroquímica. Os dados foram comparados com cérebros normais da mesma idade. Os autores constataram que os níveis de fosfoetanolamina se encontravam 64% reduzidos no cortex temporal (área 21 de Brodmann), 48% no cortex frontal (área 9 de Brodmann) e 40% no hipocampus. Estes dados foram estatisticamente significantes quando comparados com cérebros normais da mesma idade. Os níveis de etanolamina se encontravam 33% reduzidos no cortex parietal ( área 3-1-2 de Brodmann) e 12% no cortex occipital (área 17 de Brodmann) porém , esses dados não alcançaram significância estatística (Ellison -1987). As funções precisas da fosfoetanolamina (PEA) e da etanolamina (EA) no tecido nervoso são desconhecidas.

Repórter: Fale-nos sobre os testes em cobaias?

Dr. José de Felippe Júnior: Experiências de laboratório constataram que no coelho a EA entra na retina por transporte ativo (Pu - 1984) ; no pombo ela é liberada por estimulação do nervo óptico (Wolfsensberger - 1982) e no rato é liberada nos núcleos da ponte por estimulação elétrica.(Pershak - 1986).A etanolamina modula respostas ao ácido gama-aminobutírico e à glutamina. em pombos (Wolfsenberger - 1982). No coelho a PEA é liberada do hipocampus após despolarização juntamentecom potássio, glutamato ou metil-aspartato. A liberação de PEA está sempre associada com o aumento da concentração de taurina. A interação entre taurina e PEA foi confirmada quando se mostrou que a taurina exógena e os bloqueadores da recaptação de taurina aumentam os níveis de PEA. O metil-aspartato induz a liberação de taurina e PEA dos locais dendrosomaticos, mas não dos sinaptosomáticos (Lehmann - 1984 e 1985).

Repórter: O senhor  está falando grego, com certeza, para a maioria dos  nossos leitores, mas de uma coisa estou certo, a ciência está conseguindo resultados excelentes para tratar da doença. Qual seria o próximo passo?

Dr. José de Felippe Júnior:   Foi constatado que a EA se converte em PEA no sistema nervoso sob a ação da etanolamina-kinase. No próximo passo, através da via de Kennedy, forma-se a fosfatidiletanolamina, um dos quatro fosfolípides componentes da membrana celular (Pu - 1984). Uma segunda via envolve o cálcio estimulando a incorporação de serina, etanolamina e colina nos fosfolípides endógenos já existentes, em reações que não precisam de ATP (Porcellati - 1971). Lembremos que a colina é uma trimetil-etanolamina que se transforma por acetilação em acetilcolina o principal neurotransmissor envolvido na memória. Recentemente foi descrito na substância branca do cérebro de pacientes com Alzheimer uma redução do conteúdo de mielina (Brun - 1986 e Malone - 1985). No cortex destes pacientes encontra-se aumento de fosfomonoesteres e fosfodiesteres e anormalidades envolvendo o glicerol 3-fosforilcolina.(Barany - 1985, Pettigrew - 1986 e Miatto - 1986) , porém, estas anormalidades não estão associadas com o aumento da atividade da fosfolipase D, que na verdade está diminuída no Alzheimer (Kanfer - 1986). É possível que a PEA e a EA poderiam influenciar vias de controle da produção de colina e de fosfolípides na doença de Alzheimer (Maire - 1984).

Repórter:  Então a carência da fosfoetanolamina (PEA) e a etanolamina (EA) é que provocam a doença? 

Dr. José de Felippe Júnior:  Pesquisadores constataram que a diminuição da PEA e da EA no Alzheimer pode interferir com a eficácia das sinapses e com a função da membrana celular neuronal. Por outro lado a PEA está envolvida com a fosforilação oxidativa mitocondrial. Quantidades ideais de PEA no organismo geram fosfatidiletanolamina e fosfatidilcolina componentes essenciais da membrana celular e mitocondrial. Segundo o trabalho de Ellison, são as regiões do cortex temporal com maiores reduções de PEA e EA, onde ocorrem as maiores alterações patológicas, evidenciando o importante papel destas duas aminas na fisiopatologia do Alzheimer. Outros autores também constataram marcante redução de PEA e EA no cortex temporal (Mann-1985).

Repórter: Qual a conclusão a que se chegou até agora?

Dr. José de Felippe Júnior:   Na doença de Alzheimer as evidências fisiopatológicas apontam para um defeito da fosforilação oxidativa mitocondrial com diminuição da produção de ATP nos locais mais afetados pela doença e também uma diminuição de fosfoetanolamina e etanolamina nestas regiões, substâncias que fazem parte da membrana celular e da membrana mitocondrial e que estão diretamente envolvidas com a produção de ATP via cadeia respiratória mitocondrial.  Atualmente está em andamento trabalho piloto empregando a fosfoetanolamina e medidas nutricionais para aumentar a eficácia da fosforilação oxidativa ( sopa mitocondrial: riboflavina, nicotinamida, coenzimaQ10, vitamina C , vitamina K3, l-carnitina, l-taurina, magnésio ) com resultado parcial muito animador.

Prof. Dr. José de Felipe Junior - Livre-Docente de Clínica Médica - Medicina intensiva  Doutor em Fisiologia - Nutrologo

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